
Sabe qual não é o problema? A prova não é o problema. Sete milhões de inscritos não são um problema. As cotas não são um problema.
E você também não.
Três minutos pode parecer uma missão impossível. Se a sua cadeira, assim como a minha, era estreita e desconfortável, quero dizer que esse não era o maior problema. De fato era um incômodo, mas para ser sincera nem pensei nisso. O problema não é aquela matéria que você tem dificuldade, e que, por ironia do destino, está lá naquela prova de um fim de semana tão importante. Você podia estar saindo com seus amigos, quem sabe um boteco. Mas eles estão no mesmo barco que você. É a sua hora de decidir o seu futuro. Mas, me diz, por quê tanto nervosismo diante de um monte de folhas escritas?
Quero dizer que elas não mostram quem você é.
Elas não contam a sua vida escolar ou seu verdadeiro desempenho no Ensino Médio. Elas contam um breve estado de espírito durante um sábado e um domingo. Elas contam a sua sorte, ou até o seu azar, de ter visto a matéria na mesma semana, e vê-la em uma questão qualquer. Sorte se lembrar, caso contrário, desgosto de sua mente não colaborar na hora crucial do vamos ver. Uma prova que, sim, avalia uma parte do seu colegial, mas digo: você não é uma nota.
Você é muito além dela, tenha ido bem o mal. Aquelas combinações numéricas, médias e desempenho não são você. São o que sua memória se deu o luxo de lembrar. Ou um ponto do conteúdo que seu professor fez questão de reforçar. Ou aquele macete que você nunca esqueceu. Mas você e o que tem de mais especial dentro de ti não estão ali. Sinto muito que isso seja ignorado. Que o seu talento, seja ele qual for, foi limitado em um gabarito cheio de bolinhas de caneta preta. Lamento que sua facilidade com violão ou sua alma movida a música tenham sido engolidas por questões objetivas. Também que não querer saber se você é uma pessoa de oratória forte, de fácil convivência ou de bons conselhos. Ou, sei lá, se você não fala muito, mas de coração bom e ombro amigo. Ok pontuar a sua capacidade cognitiva e intelectual, mas repito: não está ali a sua inteligência pura e exata, sequer o que você realmente sabe. Você pode ter chutado uma questão que sabia, mas não deu tempo de ler. Sua mente pode precisar de mais que três minutos e isso não significa que você é pior que todo o resto. Sinceramente, prefiro deliciar no problema e conseguir resolvê-lo a ser aquela pessoa que logo desiste – até porque não é isso que a vida espera de você. Eu espero que você saiba lidar com os desafios e, de acordo com o seu tempo, tão relativo tempo, possa superá-los. O sucesso é a sua persistência após a falha. Mesmo quando achava que não conseguia.
Eu acredito.
Você não é as 30 linhas de uma redação que, convenhamos, limita qualquer essência de argumentação. Ou vai dizer que você se baseia em apenas dois argumentos para cada tema que lhe é proposto? E outra, se sua ideia for ainda que boa e surpreendente, você pode ser mal interpretado, afinal você não seguiu o fluxo e o esperado, mesmo que a sua argumentação não estivesse errada.
E um tema sensível e muito divergente: as cotas. O que você pensa?
Você acha que cada um deveria fazer sua parte? Se você estuda em escola particular, não é culpa sua ser mais "financeiramente beneficiado"? Ei, você parou para pensar que também não é culpa de quem faz parte de uma família que sequer teve oportunidade de entrar numa universidade? Posso dizer que as cotas podem ser a única maneira de pessoas que merecem reconhecimento e, por direito a educação, estão um pouco mais perto de conseguir mudar uma realidade. Como eu li certa vez, isso não é um boost na frente de você, não é alguns metros a sua frente antes da largada, muito pelo contrário. Eles continuam a quilômetros de distância, porque (não vou generalizar) foram anos de ensino desestruturado, de professores desmotivados porque o estado, o Governo, ou seja lá o responsável pela administração da escola, não deu assistência e suporte a docentes de uma carreira tão essencial para o futuro da Nação. É aí que não concordo por completo: isso independe de pele. Há brancos pobres e negros ricos. Ainda que a maioria seja o contrário. Aqui coloco uma pausa, um momento de reflexão de um texto escrito por Luh de Souza e Francisco Antero aqui que espero que te faça pensar um pouco mais.
Aplique o Teste do Pescoço em todos os lugares e depois tire sua própria conclusão. Questione-se se de fato somos um país pluricultural; uma Democracia Racial
1. Andando pelas ruas, meta o pescoço dentro das joalherias e conte quantos negros/as são balconistas;
2. Vá em quaisquer escolas particulares, sobretudo as de ponta como; Objetivo, Dante Alighieri, entre outras, espiche o pescoço pra dentro das salas e conte quantos alunos negros/as há . Aproveite, conte quantos professores são negros/as e quantos estão varrendo o chão;
3. Vá em hospitais tipo Sírio Libanês, enfie o pescoço nos quartos e conte quantos pacientes são negros, meta o pescoço a contar quantos negros médicos há, e aproveite para meter o pescoço nos corredores e conte quantos negros/as limpam o chão;
4. Quando der uma volta num Shooping, ou no centro comercial de seu bairro, gire o pescoço para as vitrines e conte quantos manequins de loja representam a etnia negra consumidora. Enfie o pescoço nas revistas de moda , nos comerciais de televisão, e conte quantos modelos negros fazem publicidade de perfumes, carros, viagens, vestuários e etc;
5. Vá às universidades públicas, enfie o pescoço adentro e conte quantos negros há por lá: professores, alunos e serviçais;
6. Espiche o pescoço numa reunião dos partidos PSDB e DEM, como exemplo, conte quantos políticos são negros desde a fundação dos mesmos, e depois reflitam a respeito de serem contra todas as reivindicações da etnia negra;
7. Gire o pescoço 180° nas passeatas dos médicos, em protesto contra os médicos cubanos que possivelmente irão chegar, e conte quantos médicos/as negros/as marchavam;
8. Meta o pescoço nas cadeias, nos orfanatos, nas casas de correção para menores, conte quantos são brancos, é mais fácil;
9. Gire o pescoço a procurar quantas empregadas domésticas, serviçais, faxineiros, favelados e mendigos são de etnia branca. Depois pergunte-se qual a causa dos descendentes de europeus, ou orientais, não são vistos embaixo das pontes ou em favelas ou na mendicância ou varrendo o chão;
10. Espiche bem o pescoço na hora do Globo Rural e conte quantos fazendeiros são negros, depois tire a conclusão de quantos são sem-terra, quantos são sem-teto. No Globo Pequenas Empresas e Grandes Negócios, quantos empresários são negros?
E completo: a questão não é dizer que eles são inferiores intelectualmente – porque é exatamente o que argumentam aqueles que são contrários, e no fundo é verdade, é como se tal mecanismo afirmativo supusesse que negros são menos inteligentes, o que é uma mentira cruel e inconcebível – mas como uma forma de reparar uma sociedade cheia de preconceitos e discriminação. Acontece que são eles quem compõem a maior parte das classes baixas, e essa é a triste, mas apática população brasileira, que ao ver que algo vai mudar no padrão estático, quase segregacionista, que será oferecido a eles a chance de ingressar numa instituição pública de graduação, logo se sentem prejudicados pelas vagas a menos no processo seletivo. Um bando de umbiguistas.
É preciso entender que não se trata de uma medida efetiva, mas provisória e que visa um reparo a curto prazo, entre dois e cinco anos terão os primeiros resultados. Entenda, defendo o investimento e a reestruturação da base do ensino público, desde o Ensino Fundamental, para que tenha, de fato, excelência na educação. Tanto que, justamente pelos problemas sociais, como educação, saúde e cultura, o brasil ainda não é considerado desenvolvido, porque de recursos, população ativa, estrutura econômica, sim, o Brasil tem. Mas e o IDH? E a distribuição de renda? Infelizmente ainda são necessárias grandes intervenções do Estado, já que a estrutura social não é estável. País sem pobreza sim, mas a meta é um país rico: de pesquisas, de cultura, de educação, de influência. Visionário talvez seja acreditar que as cotas são um primeiro e sutil passo rumo às melhorias. É imprescindível que ocorra o reparo de décadas de preconceito contra os negros para que o avanço chegue. E você que, assim como eu, está aí ansioso pelo ENEM, pelo resultado do SISU, peço apenas uma coisa: pense diferente. O problema não é você, apenas acredite na sua capacidade. E se você "perdeu" sua vaga para um cotista, de certa forma o Brasil está ganhando. Estamos no mesmo barco e se temos metade das vagas para lutar, então que lutemos e façamos o que está ao nosso alcance. Somos todos capazes, independente das nossas limitações, dificuldades, etnia e classe social. É um desafio sim, mas quem disse que é impossível? Se não der certo, lembre-se de que você não é incompetente, mas não deve ser impaciente. Persista. Posso ouvir um amém?
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